segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Amores vãos. Vivo-os. Se vão. Precisos.
Faltam-me todas as coisas que já tenho.
Às vezes necessito ser criança. Fugir dessa confusão adulta de tristezas e fobias.
O excesso me causa estranheza. Demais é como a falta. Sou um só. E acho que meu. Por vezes canso de mim mesmo. E me abandono. E me resgato.
Sempre sou mais do que suporto. Em tudo. Não caibo mais em mim. Me sobro. Me derramo. Me espalho. Junto só o necessário.

domingo, 17 de outubro de 2010

E se

E se o sol não for quente o bastante para me aquecer? E se a lua não for clara o bastante para iluminar a minha escuridão? E se a flor não for colorida o bastante para pintar meu dia? E se os caminhos da vida forem tortuosos? E se eu perder o chão que conserva meus pés no lugar quase certo? E se eu sonhar que meus sonhos são impossíveis? E se tudo por aqui for amargo demais para ser provado? Ainda assim nada disso importará. Porque você, para mim, tem a indelével destreza de conseguir ser todas as coisas, belas e impuras, do meu mundo.

Esvai-se

O último pingo escorre pelo rosto cansado. Desce lento, contornando os olhos fundos e tristes. Cruza o canto esquerdo da bochecha áspera de menina envelhecida. Tudo em volta tem aparência de árvore de galhos secos. Só o último pingo se encarrega de dar um pouco de vida àquela face jovem e transtornada. A pele tenta sugar, com todas suas forças, aquele suspiro sem ar. Em vão. O pingo segue a escorregar por entre as rasuras da tez sofrida. Aproxima-se da boca desidratada. Contorna o que um dia teve formato de coração vermelho. Passa pelo queixo marcado como a ferro de marcar boi. Pendura-se na extremidade baixa do rosto. Cai sobre o colo magro e de roupas esfarrapadas pelo tempo que não o dela. A menina ofega uma respiração temerosa, pressente que algo se encerra. A lágrima para. Fita-a, a menina. Não existe outra. Começa a evaporar. Olhos entreabertos. A lágrima se esvai, apaga-se devagar como o fim da fogueirinha de criança. Pálpebras pesam moribundas. O pingo seca. O corpo também.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Quase isso

Uma vida que se lhe escapa pelo meio dos dedos. Mundos agora distantes. Apartei-me, por um tempo. Havia baixado meu Q.I, como diria Caio Fernando Abreu. Mas, mesmo assim, trouxe comigo aquela flor de plástico que lhe prometera; está cada dia mais murcha; espero que não seja a representação estética do sentimento, daquilo que não se dizia sentir: por medo, insegurança, fraqueza, sei lá.
Uma vez disse ou pensei ter dito: torno-me criança, quase infantil, quando amo. Tento ser centrado, adulto; não consigo. Expressar-me, por meio da palavra escrita, sempre foi mais fácil. As letras assim, no entanto, parecem meio vazias. Nunca li para você um poema meu.
As ideias vêm, simples, e formam frases quase belas. O problema é não praticá-las; perdem o sentido. A melancolia é algo rotineiro: taciturnas como são as pessoas que amam. Felicidade é uma ilusão, vai e vem.
Escrever deve ser uma forma de proteção, uma cortina para, entre atos, tentar esconder a desilusão. As cenas se repetem; o teatro está ficando velho, às traças. A plateia, pouco a pouco, deixa seus lugares: vai viver sua realidade mascarada.
Esse deve ser o verdadeiro palco. Quem imita quem, afinal de contas? Eu o imito, você me imita? A quem copiamos se, no fundo, todos queremos ser nós mesmos?